Mais alto que o som: artistas que conquistam pela personalidade

Desde antes de escrever sobre Nick Cave, planejo um post sobre os artistas que me conquistaram primeiro pela personalidade e só depois pela música. Chegou a hora, finalmente!

Na minha relação com a música, a personalidade de alguns artistas falou mais alto que o som, o que não implica em ausência de talento ― muito pelo contrário.

Teve gente que eu quis gostar porque me atraia pelo nome e pela imagem, mas isso nem sempre deu certo. E teve gente que eu fui logo gostando justamente pela personalidade e torci, de dedos cruzados, para que gostasse da música também ― o post de hoje é sobre esse pessoal.

Antes de começar, vou cometer o deslize de fazer uma marca temporal aqui. Falar sobre a personalidade dos artistas, e depois de sua música, me faz pensar no quanto eu adoro pesquisar sobre suas vidas, história e acompanhar sua evolução ouvindo seus álbuns e conhecendo outras obras.

A essa altura da vida, ao menos por ora, chega a doer ter cada vez menos tempo para isso e, especialmente, cada vez menos tempo para trazer isso para o Yellow. Seguimos aqui, porém (não é mesmo? Vocês seguem comigo?). Sigamos.

Que personalidade é essa que toca mais alto?

Não existe um perfil pré-definido para as personalidades que chamam a minha atenção a ponto de, ao menos em um primeiro momento, se destacarem mais do que a música que o artista faz.

Para tentar fazer você entender, preciso dizer que estou falando de uma personalidade artística que por vezes, é a mesma que a personalidade “real” da pessoa ― considero todas reais, por isso as apas ―, mas não é necessariamente assim.

Um dos que me chamaram a atenção pelo nome e pela figura foi Marilyn Manson. No fim das contas, porém, tirando a canção The Beautiful People & mOBSCENE, o segundo Manson mais famoso da história da música nunca me agradou muito.

Vocês sabiam que o Charles Manson, o líder da seita assassina que matou Sharon Tate e cuja história ganhou tons incríveis (eu amei) em Era uma Vez em Hollywood…, também compunha? O sonho do cara era ser o novo Beatle e teve até banda gravando as composições do sujeito. 

Outro que me conquistou primeiro pelo nome foi Ozzy Osbourne, o tiozão doido que arranca cabeça de morcego com os dentes. Essa é a principal referência não musical de Ozzy, certo?

Eu considero a voz de Ozzy única, mas antes de ligar para isso e para toda a história do Black Sabbath que talvez eu conte aqui um dia (não sei, já tem em muitos lugares por aí), eu me perdia assistindo a ‘The Osbournes’. O cara e quase toda a sua família participavam de um reality show quando a MTV ainda era Music Television. Eu adorava!

Ainda assim, ainda pensando ninguém conseguiria ser a caricatura ambulante que Ozzy Osbourne é ― e parte disso infelizmente vem das consequências de seus vícios ―, ele ainda não entra na categoria dos “acidentes cósmicos”.

O que diabos é um acidente cósmico e do que estamos falando

Calma. Eu não estou querendo complicar as coisas. Achei por bem explicar primeiro que que parece ser uma personalidade que toca mais alto que a música, mas não é para ajudar a você a separar as coisas.

Certamente, essa é uma classificação minha e você tem todo direito de discordar dela. Um ponto de concordância que eu encontrei em uma conversa sobre o assunto foi a que deu origem à categoria dos acidentes cósmicos.

Falar de Nick Cave aqui no blog foi bem mais bacana do que eu esperava! O assunto rendeu uma troca de ideias com o Rapha, do delirium scribens em que ele acabou me dizendo o seguinte

“[Nick] é um desses artistas que se não tivesse nascido, por conta de algum acidente cósmico, ninguém teria entrado no lugar. (Eu não acho que isso vale pra todo mundo.”

Eu nunca tinha pensado em chamar caras como Nick Cave de acidentes cósmicos, mas a ideia veio daí porque eu concordei com o Rapha: ser original a esse nível não é pra todo mundo.

A história da música está repleta de artistas e bandas que tentaram ganhar destaque em uma cena musical da época, sendo que todos soavam mais ou menos da mesma forma. Em meio a uma situação assim, aconteceu de alguns serem premiados com a combinação de seu esforço e talento com o timing perfeito.

Isso aconteceu com ninguém menos que o Nirvana, por exemplo. Cá pra nós, eu dificilmente vou dizer que alguém seria capaz de entrar no lugar da “banda de Kurt Cobain” e unir todas as tribos como os caras fizeram. Seria uma heresia contra minha banda favorita de todos os tempos. Mas não acho que sejam um acidente cósmico.

Vale deixar registrado, primeiro eu gostei do som do Nirvana e depois me atraí pela personalidade da banda e, especialmente, de Kurt Cobain.

Basicamente, então, é disso que estou falando quando penso na personalidade que toca mais alto que a música: uma pessoa tão única e original que deixaria um baita buraco na história se não existisse porque não teríamos alguém parecido para colocar no lugar.

Inclusive, se você me permite dizer, nesse momento da história (fevereiro de 2020), coloco a queridíssima Billie Eilish na lista dos que podem parecer um acidente cósmico, mas por mais talentosos que sejam, estão surfando na onda do timing.

E só para constar, eu adoro a Billie e mais pela personalidade do que por suas músicas, propriamente. Me diz aí nos comentários se você acha que vale a pena eu fazer um post para falar só dela aqui no Yellow, tá?

David Robert Jones: o pai dos acidentes cósmicos

Se o assunto é personalidade, é impossível não mencionar o camaleão do rock. David Robert Jones ou David Bowie é um dos meus artistas favoritos e eu dificilmente vou tirá-lo do pedestal em que coloquei.

Foto de David Bowie
O pai dos acidentes cósmicos: David Bowie

Para mim, Bowie não é nem gente, é extraterrestre ― e acredite em mim quando digo que falo isso com muito amor porque considero um elogio! Sendo um ET, é certo que é também um acidente cósmico e seu Ziggy Stardust não me deixa negar.

Eu sequer parei para fazer as contas em meio a um resgaste histórico para descobrir se David Bowie pode mesmo ser o “pai” de todos os outros acidentes cósmicos. Digo, não parei para pensar se na minha lista há alguém que veio antes dele porque acho que não concebi a ideia de personalidade tocar alto antes de conhecer Bowie.

Quando a gente olha para trás na trajetória do sujeito, percebe que ele se aproveitou muito de elementos que já existiam na cena artística e musical para construir sua personalidade, personas e personagens.

Talvez isso soe pouco original, mas a verdade é que, com os elementos todos à disposição, ninguém conseguiu fazer o que David Bowie fez e por isso ele é (me recurso a dizer era) único.

Sem prolongar essa discussão, vou direto para o fato de que não há qualquer dúvida de que Bowie ou Ziggy ― eu realmente não lembro quem eu conheci primeiro ― me conquistou pela aparência. E demorou um bom tempo para que eu finalmente ouvisse algo para poder dizer a mim mesma “ah, então esse é o David Bowie”.

Entendeu agora como é essa história da personalidade falar mais alto? Eu era cativada por qualquer coisa do cara que passava na TV, gostava de dizer que “sabia” quem era ele nas rodas de conversa ou de fingir naturalidade quando seu nome surgia. Mas música? Só fui conhecer depois.

Artistas que me conquistaram pela personalidade

Chegou a hora. Se você me conhece e/ou frequenta as páginas do Yellow, é provável que não tenha se surpreendido nem um pouco com a menção ― ou destaque ― ao camaleão do rock.

Além disso, já sabe que Nick Cave participa dessa minha categoria de acidentes cósmicos. Agora, vai saber quem são os outros artistas que eu só fui ouvir depois de me apaixonar pela personalidade, figura e, porque não, aura artística.

PJ Harvey

Se você leu o post sobre Nick Cave, ver o nome de PJ Harvey, ou Polly Jean Harvey na lista dos artistas que eu considero acidentes cósmicos não é surpresa, mas pode ser estranho.

PJ é, provavelmente, a artista cujo sucesso foi menos estrondoso entre todos os que mencionei neste post, mas isso não anula o fato de que ela foi/é ícone de uma geração.

Além disso, ainda que fazendo menos barulho, PJ é bem original. Falei sobre a genialidade dela aqui no Yellow ainda em 2015, no post Como gravar um disco.

Patti Smith

É bem provável que eu tenha escutado alguma música de Patti Smith antes de ser atraída por sua personalidade. As chances são altas de que tenha sido Because the Nightmas a questão é que, se eu ouvi, ouvi sem fazer a menor ideia de quem era.

Patti me ganhou de verdade ― a ponto de eu decorar como escrever Robert Mapplethorpe sem precisar consultar o Google ― quando li Só GarotosSem pestanejar, se você me disser que ainda não conhece Patti ou pouco sabe de sua arte, eu recomendaria que você começasse pelo livro.

Patti, em minha vida, está lado a lado com Kim Gordon como mulher de destaque pela personalidade e história, antes da própria música. A questão com Kim é que eu me envolvi com o Sonic Youth antes de querer saber mais sobre a vida dela e por achar que, ainda que incrível, ela não é um acidente cósmico.

Nina Simone

Bom, preciso ser sincera. Acho que Nina Simone jamais conquistou alguém pela personalidade, propriamente. Era uma mulher muito temperamental, ainda que sua história seja repleta de justificativas para isso.

A verdade aqui é que eu fui atraída pela mística sobre quem foi Nina Simone antes de querer me aproximar da música dela. Eu demorei muito na vida para começar a gostar de jazz e R&B e, se a essa altura da vida a voz da experiência já pode ser entoada por mim, recomendo que você não perca tempo e comece logo!

Quando assisti à apresentação de Carly Rose Sonenclair de Feeling Good, uma de minhas músicas favoritas na vida desde então, foi que tive contato com consciente com o talento de Nina Simone.

Escrevi sobre ela no começo de 2019, no post Nina Simone: uma vida de talento e tormento e acredito que tudo o que foi dito lá explica por que essa mulher foi um fenômeno, uma obra de um acidente cósmico. Na vida e nos palcos, Nina Simone seria difícil de reproduzir.

Montagem com fotos de PJ Harvey, Patti Smith, Nina Simone
PJ Harvey, Patti Smith, Nina Simone

Por que eu tirei Iggy Pop da minha lista

Para finalizar o post, queria contar por qual motivo eu tirei Iggy Pop da lista. Tenha certeza de que a personalidade dele me atraiu bem antes de sua música.

Ainda na adolescência, eu fingia saber o que estava dizendo quando afirmava conhecer Iggy simplesmente por não saber por que diabos alguém não gostaria de saber quem é um sujeito chamado Iggy Pop!

A saber, o nome do cara é James Newell Osterberg. Fazia ideia disso? Eu tive que pesquisar para contar aqui porque a verdade é que eu nunca liguei, nunca me interessei pela pessoa James Osterberg porque, desde o início, me prendi à persona Iggy Pop. Do nome ao jeito caricato, é envolvente.

O post sobre Nick Cave finalmente foi publicado depois que eu li sobre um single do Iggy Pop no blog do Guilherme VanolliÀ época, afirmei que “Iggy Pop também integra a lista de artistas que me chamam mais a atenção pela figura artística do que pela arte em si”.

Ainda que isso permaneça verdade, Iggy me chama mais a atenção pela figura artística do que pela arte em si, não o considero um acidente cósmico.

Por mais que o sujeito tenha uma personalidade só dele, artisticamente, não acho que ele ou o The Stooges deixariam um buraco na história musical da humanidade se não existissem. Fico feliz que existam, porém, ok?

Existem outros acidentes cósmicos?

Convido você a responder a pergunta e contar para mim quem você acha que se encaixa na categoria dos acidentes cósmicos do universo musical.

Eu mesma posso contar que existem outros artistas que considero tão originais quanto os mencionados nessa lista. Amy Winehouse certamente é uma, mas acontece que me atraí pela música primeiro e só depois pela sua persona e pessoa.

E talvez eu esteja me contradizendo agora ― e esteja sendo levada pela voz de fã falando mais alto na minha cabeça ―, mas posso dizer que Kurt Cobain, individualmente, foi um acidente cósmico.

Mais do que pelo som, pela expressão artística e pessoal que transformaram o cara em algo tão poderoso em sua capacidade de se comunicar, ainda que por frases tortas e sem sentido, com tanta gente.

E então, o que achou dos acidentes cósmicos? Tem algum artista que chamou sua atenção primeiro pela personalidade? Conta pra mim!

0 resposta

  1. Hi Lari. I hope all is well with you? Very interesting posts. I have to agree on Marilyn Manson. I expected a weird take on a combination of Marilyn Monroe and Charles Manson. It was close. I like of lot of Manson’s music. I knew Ozzie from Black Sabbath. Sometimes groups have cool names, but I cannot connect with their music. The Dixie Chicks and Lady Antebellum are a good examples. I like your concept of Accidental Cosmic Connections.

    1. Hi, Tim! I’m doing fine. How are things with you?
      To be honest, I always apreciated Marilyn Manson’s idea of gattering two memorable names to ‘create’ his persona, eventhough this includes Charles Manson. But the guy never really talked to me lol.
      What do you mean when you say you knew Ozzy?
      And yeah, The Dixie Chicks should be a cooler group to match their name!

      1. I knew who Ozzie was from Black Sabbath before he went out on his own. I don’t know him personally. Have you listened to any of my recent music that I’ve posted over the past few months? I’d like to what you think about it. If you click on Music on the top menu bar on my blog page, you will get all the music I’ve posted recently.

        1. Oh, okay! I got confused with that info but I blame the excitment of the idea of meeting someone like Ozz lol
          I just saw yours music posts and I’ll give’em some atention today to share my opinions with you 🙂

          1. I think Ozzie bought into one of our cities in New Mexico a couple of years ago. He’s been to Albuquerque a few times.

          2. I regret not going to Ozzy’s concert with Black Sabbath when they came to my city. Now I try to embrace every opportunity other artists I like create by coming here

  2. É sempre ótimo quando uma bobagem que eu falo serve pra alguma coisa.

    Você falou do Charles Manson, me veio uma artista que, eu diria, me interessa na mesma proporção pela obra e personalidade, mas é da literatura: Joan Didion. Eu já devo ter falado dela pra você, então só vou te sugerir que procure o ensaio “White Album”, um dos mais famosos dela. É um artigo pessoal sobre como foi viver em Los Angeles, no fim de 1960. Nele ela descreve encontros com os Black Panther, festas com artistas da época (Janis Joplin, por exemplo, que eu incluiria nessa lista), o dia em que ela assistiu The Doors gravando no estúdio (Jim Morrison poderia entrar na lista), e as muitas entrevistas que ela fez com Linda Kassabian, que foi parte do culto do Manson. A Linda disse pra Joan que, quando o grupo estava a caminho da casa da Sharon Tate, eles passaram em frente a casa da Joan – o que Joan interpretou como uma forma de dizer: podia ter sido você. Ao mesmo tempo em que ela conta esses casos, ela fala dos problemas psicológicos com os quais ela estava lidando, a filha pequena, um casamento em crise. Talvez ela seja a definição do tema “artistas que conquistam pela personalidade”, porque a arte dela sempre foi pessoal, em primeira pessoa, mesmo que a reportagem que ela estivesse escrevendo fosse o perfil de um ator das antigas, ela começava falando da relação dela com a obra do ator. Caso queira um aperitivo, pra te convencer a ir atrás do ensaio, Netflix tem esse documentário sobre ela chamado “The Center Will Not Hold”, dirigido pelo sobrinho dela, um projeto perfeitamente pessoal que resume todas as fases da obra dela.

    Eu acho que eu colocaria Tom Waits e Michael Gira nessa lista também, mas eu acho que disse isso no comentário da postagem anterior. O caso desses é curioso, porque são duas pessoas que de forma alguma gostariam de chamar mais atenção pela personalidade do que pela obra e a obra em si já fala alto o suficiente.

    1. Caramba! Eu amo as bobagens que você fala 🙂

      Já anotei a dica do documentário e quem sabe isso nos renda algo também. Didion parece ser alguém em quem eu precisaria mergulhar por um tempo, como fiz com William Burroughs ou Jack Kerouac.

      Eu fiquei pensando sobre Janis, depois de seu comentário, e sobre porque eu não pensei nela para a lista. Certamente, fui atraída pela personalidade antes do que pela música… Talvez, e só talvez, seja porque eu siga gostando bem mais da personalidade. É um pouco diferente do que acontece com Nick Cave: ouço pouco, mas me disponho mais a ouvir do que faço com Janis (ao menos atualmente). Algo a se pensar.

      Jim Morrison provavelmente foi um acidente cósmico, mas ainda que eu goste do som do The Doors e tenha me atentado para algumas coisas sobre ele, nunca me intrigou o bastante, sabe? Pode ser que ainda aconteça 🙂

  3. Oi. Pra mim é um prazer você oportunizar este espaço aos leitores… Obrigado!
    Vou ser breve. Lista muito bem feita, bem explicativa,
    Tenho 48 anos, sempre tinha ouvido falar de Iggy Pop, mas nunca tive interesse, estava numa vibe mais pop, eletrônica… Mas com a idade, graças a Deus fui ficando mais eclético…
    Quando ouvi ele e os seus trabalhos mais recentes, estou admirando e ficando cada vez mais fã! Me chamava a atenção mas adquiri o respeito depois de ouvir… Acho que não se encaixa nesse tipo de lista…kkkkk
    Você me fez pensar… quem eu poderia colocar nessa lista? Nina Simone, Joe Cocker, Miles Davis… Grande abraço!!

    1. Ei, Luciano. Bem vindo 🙂 De minha parte, Miles Davis é um bom candidato à lista. Quanto ao Iggy, talvez possamos pensar em uma sub-divisão para englobar aqueles que chamam a atenção pelo nome a ponto de acharmos que podem ser acidentes cósmicos, mas que não o são necessariamente!

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