“Sexo, drogas e rock n’ roll”: quando a diversão acaba

“Meus heróis morreram de overdose” ou de decisões ligadas à dependência química e a outros problemas que lhes fizeram perder o controle e deixar esse mundo tragicamente. O que eu aprendi com isso?

A música, Ideologia, é de Cazuza e seu verso “meus heróis morreram de overdose” sempre me lembram um erro que já deveríamos estar cansados de cometer: o de glamourizar aquilo que não tem (ou não deveria ter) glamour algum.

Quantas vezes você viu e/ou usou o manjado “sexo, drogas e rock n’ roll” para se referir a uma combinação positiva? A um ideal? A um sonho ou, porque não, a uma ideologia que você gostaria de viver? Se não foi você quem pensou e agiu dessa forma, ainda que sem pensar muito a respeito, foi alguém aí do seu lado.

Fabio Assunção e seu tapa na cara da sociedade

Recentemente, eu e o Brasil fomos surpreendidos com uma atitude do ator Fabio Assunção. É provável que você tenha visto por aí, já que virou post viral na internet e notícia em alguns portais.

Fabio é aquele famoso que lida com o vício em álcool. Por muito tempo, ele foi e pode ser que continue sendo, alvo de piadas, memes e outras formas de zoação — pode ser até que você já tenha ouvido (ou dito) a frase “hoje, eu vou ficar mais louco que o Fabio Assunção” sair da boca de alguém que decidiu que era dia/noite de tomar todas, de beber até não aguentar mais.

E o que, enfim, aconteceu foi o seguinte: a La Banda, um grupo de músicos, criou um “hit” para o carnaval que leva o nome e faz menção ao Fabio Assunção, além de conter versos como “Hoje eu vou beber, hoje eu vou ficar locão”.

Eis que o ator decidiu se posicionar e, para a surpresa de muita gente (minha inclusive), buscar um acordo com o grupo para ter os direitos da música e usar o dinheiro para ajudar uma associação que trata dependentes químicos. Quando a situação veio à público, ele compartilhou um vídeo acompanhado da transcrição abaixo em seu perfil no Instagram.

Imagem de print do post do Fabio Assunção sobre música que faz referência ao seu alcoolismo
Reprodução/Instagram

Sexo, drogas e rock n’ roll: eu não quero barrar a diversão

Como muitos, eu passei anos rindo das piadas sobre o Fabio Assunção. Nada pessoal, eu só achava que tudo bem ver tudo como uma simples brincadeira — e ok se você ainda pensa assim, eu não quero barrar a diversão, quero propor uma reflexão.

Foram as palavras de outra pessoa (obrigada, Marina!) que me fizeram começar a ver a situação com outros olhos. Um dos posts diz o seguinte:

“Ficar doidão” pra muita gente é o início de um precipício.

Se você consegue sair de casa, tomar todas, dar um teco, e ainda voltar pra casa e trabalhar no dia seguinte, que Deus te abençoe e que continue assim.

Acontece que pro Fabio Assunção e pras pessoas dependentes químicas, pode não se tratar de simplesmente “ficar doidão”. É perder o controle da própria vida, sem saber quando vai ser a última dose. É ter uma mãe, esposa, filhos sem dormir em casa com medo do que pode acontecer. É perder amigos. Perder um emprego. Pessoas se afastando porque já não aguentam mais ver as crises de abstinência…

E com isso em mente, o que eu quero dizer é: se você não querer parar de zoar, não pare. Eu já acho que não convém transformar a dor alheia em piada (e vou falar melhor disso mais adiante), mas cada um com a sua opinião.

O que eu quero mesmo ou quero principalmente é tentar que você reflita sobre como esse nosso jeito despretensioso de brincar de sexo, drogas e rock n’ roll (ou qualquer que seja o estilo musical que você gosta de ouvir) sem medir as consequências pode não ser tão legal quanto parece.

A reflexão desse post é um alerta. Se não for para que a gente pense com mais carinho antes de rir do vício de alguém, que seja para a gente prestar mais atenção em nós mesmos e em quem está ao nosso redor. A vida tá difícil e por mais que a música exista como terapia para tentar nos salvar, nem sempre esse “remédio” é o bastante.

A ideia de querer viver seguindo o estereótipo do rockstar — e veja bem, longe de mim condenar o rock e querer agora buscar responsáveis pela fama que o gênero leva! — não é uma combinação segura em tempos em que ansiedade e depressão estão entre os principais males da sociedade. Em que a propensão aos excessos é um fato.

Imagem de duas garrafas de bebida
Photo by James Sutton on Unsplash

O que eu não quero que essa diversão chegue ao fim de forma trágica

Você se lembra de que eu disse que falaria mais sobre transformar a dor alheia em piada? Isso nos leva de volta ao verso “meus heróis morreram de overdose” e à nossa (espero que findada) bobagem de glamourizar o famoso clube dos 27.

Lá estão artistas como meus amados Kurt Cobain e Amy Winehouse, a incrível Janis Joplin e o sensacional Jimi Hendrix. Nem todos morreram de overdose, mas o abuso de substâncias foi denominador comum na vida de todos esses e dificilmente não está relacionado à sua morte precoce e trágica.

Foi por causa de Cobain que eu aprendi a não glamourizar a morte por suicídio. Ele é meu músico favorito desde que eu estava na quarta ou quinta série. Como fã que encontrou no sofrimento alheio refúgio para as suas próprias frustrações e problemas (quem me acompanha no Medium sabe), eu me doía toda quando via gente chamando o cara de fraco ou idiota por ter desistido da vida.

Eu sofri com isso por anos, não apenas por ele, mas por ver que a insensibilidade ou a falta de reflexão dessas pessoas, em algum nível, as fazia rir de mim também. Mas foi só com a morte do Chester Bennington — vocês que leem o Yellow devem imaginar o quanto me doeu, (já até perdi umas lágrimas agora) — que eu decidi dar uma força extra ao meu projeto de escrita sobre depressão&ansiedade lá no Medium.

É estranho pensar em como a minha própria experiência não me fez olhar com mais sensibilidade pro Fabio Assunção. Mas é também esse um motivo que me fez querer compartilhar essa reflexão aqui.

Pra muita gente, há outros fatores associados ao consumo de substâncias e ao vício que formam a receita para o desastre. O próprio Chester acumulava uma série de traumas que marcaram toda a sua vida, por exemplo. Mas o que eu quero dizer é que, quando a diversão acaba, não há espaço para brincadeira. Cuidem de si mesmos, peçam ajuda. Cuidem dos outros, respeitem e busquem ajuda.

O post de hoje foi “diferentão”. A verdade é que eu queria falar a respeito já há algum tempo, quando comecei a mudar minha forma de enxergar a situação, antes dessa história com o “hit” do Fabio Assunção.

Espero que a reflexão tenha sido positiva para vocês e se não foi, tudo bem. Em todo caso, comenta aí, me diz o que você está pensando!

0 resposta

  1. We hear about the famous people and their problems with addiction, but then there’s the side that includes personal friends or family who deal with addiction. I’ve lost a lot of friends over the years to overdoses, suicide, alcohol poisoning and accidents where drugs and alcohol were involved. It’s sad that we glamorize the destructive “sex, drugs and rock & roll” lifestyle.

    Although, I can understand how performers get hooked on drugs and alcohol. When I was playing and performing flamenco years ago, the hours and late nights wore me out. I never took drugs and I don’t drink alcohol, there was always a temptation to take something to keep me going, and then take something else to help me wind down from the exhilaration of performing. If you take what I was doing, multiply it a 100, 500 or a 1000 times for the true professional performers who play night after night after night, it’s easy to see why they start taking drugs and doing alcohol to keep themselves going. Then it can get to the point that they just keep going and going and going until their bodies just can’t take it anymore — Prince is a recent example.

    Tim

    1. Hey, Tim.
      First of all, I’m sorry for the friends you lost to this situation. I can’t imagine how sad it must be.

      Now, you mentioned something very interesting that perphaps I could have included in my post somewho. Eventhough I’ve never been a musician, I can understand part of where the temptation comes from. I don’t condem that, just would like people to think a bit more about all of these, as you know.

      Thanks for the comment! Hope you’re okay 🙂

      1. I’m plugging along. I’ve started playing guitar again (having to relearn because of my numb fingers), playing bass guitar and drums, also. I’ve written a couple of songs, I’m recording my own music and making parodies. None of it’s very good, but I’m having a lot of fun playing music again and being my own band.

        How about you? How are you getting along these days?

        1. I’m glad to know! If you’re having fun, that’s all that matters 🙂

          Oh, well… I’m doing fine. Brasil is living some turbulent days due to politics since before the election until now. I mean, everything is “okay”, but things got a little intense and even though I’m not happy with the way things turned out to be, I can only hope for the best.

          Everything else is going pretty well 🙂

          1. We have good newspapers with different editorial lines (although they don’t always give a clear statement about what they stand for). If you want to, we cant talk about this, perhaps by email 🙂 Let me know.

  2. Muito bacana o posicionamento do Fábio Assunção.
    E parabéns pela sua mensagem.
    Ano passado também perdi mais ídolos para a depressão e para o vício.
    Há cada ano que passa esses episódios se tornam mais comuns.
    Enquanto não tratarmos essa condição com mais seriedade, o quadro só se intensificará.

    1. Verdade, Brunno.
      Vivemos entre ideias de que esses problemas são tabus, “mimimi” ou coisa desses “jovens de hoje em dia”. Qualquer visão que prejudique um enfrentamento cara a cara da situação nos prejudica. Então, vez ou outra, aqui ou no Medium (bem mais por lá), eu tento compartilhar algo relevante a respeito.

      E sinto muito pelas suas perdas. Eu sei que dói.

  3. Ai Lari, sim sim sim… falar e refletir sobre isso é muito importante nos dias de hoje. Quando vejo teu posicionamento sobre esses assuntos mais polêmicos chega a me dar um calorzinho no coração, gosto de ver que ainda existem pessoas sensatas e que desejam que as coisas melhorem.

    Tenho alguém no meu convívio próximo tendo que conviver com esse peso do álcool na própria casa. A mulher em questão tem um marido que era muito da farra antes de casar com ela e agora mesmo sendo casados fazem 4 anos, ele ainda apronta as dele e faz ela se sentir mal. Ela fica insegura quando ele sai, ele volta cambaleando e no momento não pensa nas consequências disso no relacionamento. Ela sente vontade de separar pra acabar com o sofrimento, mas também entende que pra ele essas saídas são para “extravasar” o stress.
    É difícil se posicionar quando o vício estraga uma família…. vai desmontando ela aos poucos.

    Adorei a forma que o Fabio colocou que ter o apoio e procurar o apoio de alguém é importante.

    Que a gente tenha mais a capacidade de sair da nossa bolha e sentir empatia pelo próximo!

    1. É um problema muito complexo, né. Para todos os envolvidos, não é só parar ou só sair fora. A gente percebe que falta muita sensibilidade para entender isso, seja com alcoolismo, outros vícios ou outras questões como a depressão.

      Muita gente apoiou o posicionamento do Fabio e acho que isso é um bom sinal. Confesso que esperava ter visto muitos comentários de deboche à atitude dele, mas não foi assim (pelo menos, não quando chequei).

      Tô na torcida e na ação pra tentar que a gente evolua enquanto sociedade!

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